19 de nov. de 2009

Hipertermia - Intermação.

Os cães não possuem mecanismos eficientes para regular a temperatura corporal diante do excesso de calor (que pode ser causado pelo ambiente ou por exercícios), nós temos glândulas sudoríparas, "suamos em bicas" se estivermos diante de altas temperaturas, é a forma do organismo tentar eliminar calor, mesmo assim esse mecanismo é limitado, podemos morrer de calor.

Os cães têm poucas glândulas sudoríparas entre os dedos, sua forma de resfriar o corpo é pela boca, pela respiração. Por isso os cães ficam ofegantes quando fazem exercícios ou quando estão em um ambiente quente, o organismo tenta diminuir a temperatura corporal através da respiração.

O que geralmente acontece em caso de intermação:

(trecho site Bulldog Inglês) Os animais começam a apresentar respiração acelerada, coração batendo muito rápido, corpo bastante quente ao toque e, muitas vezes, alterações neurológicas (não conseguem caminhar, olhos ficam vidrados). Caso isto venha a ocorrer, indica-se procurar o médico veterinário com urgência. No entanto, se isto não for possível rapidamente propõe-se retirada imediata do cão do ambiente aquecido, resfriamento do corpo com água fresca, de preferência não utilizar água gelada para evitar algumas outras complicações pertinentes ao caso. Pode-se optar pelo uso de toalha molhada, banheira de água, balde ou ainda mangueira para resfriamento corporal. (...) E correr para o veterinário.

2- Abaixo o relato de dois casos diferentes de intermação, um pitbull que sobreviveu e outro que foi a óbito. Apesar dos termos técnicos é possível entender que o excesso de calor acaba desencadeando uma série de complicações que nem sempre podem ser revertidas, por isso a intermação pode levar a óbito mesmo depois de o cão ter sido socorrido e sua temperatura estabilizada.

INTERMAÇÃO POR EXERCÍCIO EM DOIS CÃES DA RAÇA PIT BULL – RELATO DE CASO

CYNTHIA DE ASSUMPÇÃO LUCIDI 1; FERNANDA CAMPAGNER 2; CRISTIANE MORAES BARBOSA 2; CRISTIANE CAMPOS OTONI2; REGINA KIOMI TAKAHIRA3 ABSTRACT: LUCIDI, C.A.; CAMPAGNER, F.; BARBOSA, C.M.; OTONI, C.C.; TAKAHIRA, R.K.

INTRODUÇÃO

A intermação é uma forma de hipertermia não-pirogênica que ocorre quando a produção de calor corpóreo se sobrepõe aos mecanismos responsáveis pela perda de calor e se caracteriza por temperaturas iguais ou maiores que 41,1o C, sem sinais de inflamação. Algumas causas de intermação incluem exercício excessivo, impossibilidade de perder calor em locais quentes e fechados e lesões hipotalâmicas. Fatores de risco de intermação incluem extremos de idade, obesidade, mau condicionamento físico, doença cardiopulmonar, hipertireoidismo, raças braquicefálicas, pelagem espessa e desidrataçãoA intermação por exercício ocorre principalmente em cães que não se exercitam com freqüência e/ou em dias quentes e úmidos, quando a perda de calor pelo organismo é dificultada . Pode estar associada a vários graus de alterações de todos os órgãos e sistemas do corpo, como resultado de necrose celular generalizada, podendo levar à falência múltipla de órgãos no estágio terminal. Os sistemas que podem ser afetados incluem o sistema nervoso, cardiovascular, gastrintestinal, hepatobiliar, renal, sanguíneo e musculoesquelético, podendo-se observar, respectivamente, danos neuronais; hipovolemia e arritmias; isquemia e ulceração de mucosa intestinal, translocação bacteriana e endotoxemia; necrose hepatocelular; insuficiência renal aguda; hemoconcentração, trombocitopenia e coagulação intravascular disseminada (CID) e rabdomiólise. O diagnóstico de intermação por exercício pode ser feito com base na história clínica de exercício intenso, presença dos fatores predisponentes e sinais clínicos agudos associados. Este trabalho visa alertar clínicos veterinários e proprietários para a importância deste distúrbio e sua prevenção, principalmente devido ao clima tropical de nosso país e à importância da prática de exercícios muito incentivada atualmente.

RELATO DE CASO

CASO 1: Foi admitido no Hospital Veterinário da Universidade Estadual Paulista – Campus de Botucatu (HV-Unesp-Botucatu), em agosto de 2004, uma cadela, não castrada, da raça Pit Bull, de 2 anos e seis meses, com histórico de ter sido submetida a uma caminhada de 10 km, dois dias antes, por volta de meio-dia. A cadela costumava caminhar 5 km uma vez por semana. No dia da caminhada, a temperatura ambiente média foi de 23,3oC, a máxima de 30,4oC e a umidade relativa do ar de 41%. O proprietário relatou que logo após a caminhada o animal apresentou taquipnéia, cianose, um episódio convulsivo, hematúria, diarréia, vômito e hematoquesia. No mesmo dia foram administradas por veterinário particular fluidoterapia intravenosa, glicose e cefalexina, porém o animal não apresentou melhora significativa com este tratamento. Ao atendimento o animal apresentava apatia, anorexia, vômito, diarréia, moderadadesidratação, cianose, 38o C de temperatura, dispnéia, bolhas e feridas em coxins nos quatro membros, petéquias e sufusões na pele do abdomem e sangramento vaginal. O hemograma revelou policitemia, discreta leucocitose, trombocitopenia intensa (15.150 plaquetas/mL), hiperproteinemia, normoblastemia (02 metarrubrícitos/100 leucócitos) e plasma moderadamente ictérico. Os exames bioquímicos revelaram aumento sérico moderado dos valores de uréia e creatinina (azotemia). A história clínica, o exame físico e os exames laboratoriais foramconsistentes com o diagnóstico de intermação por exercício. O animal foi tratado com fluidoterapia intravenosa (ringer lactato), glicose 5% e suplementação de potássio (KCl 19,1%). Foi prescrito ampicilina, jejum alimentar, suplemento, repouso absoluto. Dois dias após a admissão do animal o perfil bioquímico revelou azotemia moderada e atividades séricas de alanina amino transferase (ALT), fosfatase alcalina e gama glutamil transferase moderadamente aumentadas. O animal apresentou melhora total do quadro clínico 15 dias após sua admissão no HV.

CASO 2: Um cão da raça Pit Bull, macho, com quatro anos de idade foi atendido no HV-Unesp-Botucatu, em dezembro de 2004 em choque. O proprietário relatou que após ter sido submetido a uma caminhada de 40 minutos o animal não quis beber água. O animal foi molhado na tentativa de resfriá-lo e foi administrada água por via oral, porém este apresentou emese e tornou-se inconsciente. Ao exame físico foram observadas discreta desidratação, cianose, temperatura de 39,4oC, midríase, equimoses na pele do abdomem e cavidade oral e taquicardia (140 bpm). Durante o atendimento ambulatorial o paciente apresentou ainda hematoemese, fezes pastosas amareladas com muco, nistagmo e movimentos de pedalagem. O hemograma revelou policitemia, leucopenia, trombocitopenia discreta (108.575 plaquetas/mL), hiperproteinemia, normoblastemia (24 metarrubrícitos/100 leucócitos) e plasma discretamente hemolisado. A primeira urinálise revelou proteinúria moderada e presença de sangue oculto sem hematúria. A segunda urinálise, realizada 30 minutos após a primeira, revelou cor avermelhada, proteinúria e hematúria intensas e cilindros granulosos. O tempo de coagulação apresentou-se normal e a pesquisa de mioglobina na urina foi positiva. O exame eletrocardiográfico revelou arritmias ventriculares. A história clínica, o exame físico e os exames laboratoriais foram compatíveis com o diagnóstico de intermação por exercício. O tratamento consistiu de fluidoterapia (ringer lactato), ranitidina, metoclopramida, enrofloxacina, furosemida, manitol, lidocaína, atropina e bicarbonato de sódio. Apesar do tratamento o animal veio a óbito cinco horas após sua admissão no HV. A necropsia revelou congestão pulmonar, hidropericárdio, sufusões em endocárdio e epicárdio, petéquias e sufusões gástricas, congestão hepática e renal, sufusões em bexiga e congestão cerebral.

DISCUSSÃO

A intermação geralmente está associada ao aumento da temperatura corpórea, levando a danos celulares em temperaturas acima de 42º C5. O animal 1 apresentava temperatura corpórea normal, provavelmente porque foi atendido dois dias após o ocorrido. O animal 2 apresentou discreta hipertermia. Segundo a literatura apenas 29% dos cães apresentaram temperatura maior que 41,1ºC no atendimento, sendo que a maioria dos animais atendidos logo após o incidente apresentou temperatura entre 39, 5 e 41,1ºC3. Os dois animais atendidos apresentaram sinais clínicos compatíveis com a literatura já que animais com este distúrbio geralmente apresentam um quadro emergencial, com vômito, diarréia, taquicardia, taquipnéia, petéquias e equimoses, síncopes e estado précomatoso

. Os sinais clínicos podem variar de acordo com o grau e duração do contato com altas temperaturas e/ou exercício, além do grau do comprometimento do organismo. Alterações laboratoriais como policitemia; azotemia associada à cilindrúria; aumento da atividade sérica de creatina quinase e mioglobinúria e aumento da atividade sérica de ALT, associada à hiperbilirrubinemia podem revelar respectivamente hemoconcentração, insuficiência renal aguda, rabdomiólise e lesão hepatocelular. Os dois animais em questão revelaram hemoconcentração, danos renais e hepatocelulares e o animal 2 apresentou rabdomiólise. O sistema hemostático pode desregular-se quando a temperatura corpórea atinge 42º a 43ºC, havendo consumo de plaquetas e fatores de coagulação e subsequente CID5,7. Os dois animais relatados apresentaram distúrbios hemorrágicos, observando-se petéquias, sufusões e trombocitopenia, apesar do tempo de coagulação ter se apresentado normal. O prognóstico é reservado a favorável, dependendo da extensão dos danos multissistêmicos, da duração da exposição do animal às altas temperaturas e da agressividade do tratamento. A educação dos clientes é fundamental para prevenir este distúrbio.

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